À Conversa com Pedro Chagas Freitas
O homem que prometeu falhar, mas não falhou.
Afirma que não se identifica com o titulo de escritor porque não é um “iluminado”, ao contrário, é apenas “um gajo que escreve umas cenas”.
Quando começaste a escrever, alguma vez imaginaste que ias ter tanto sucesso?
Foi sempre um sonho, mas nunca escrevi focado nesse objetivo. A ideia era escrever e ser lido pelo maior número de pessoas. Começaram por ser poucas e depois acabaram por ser muitas. Fico extremamente feliz.
Foi um grande trabalho de auto-promoção que esteve na origem do teu sucesso, certo?
Temos sempre que promover o nosso trabalho seja em que área for, música, cinema, literatura...é tudo igual. Nós é que temos que nos mexer.
Portanto, a ideia de que as editoras tratam de promover os seus autores...
Essa ideia é para esquecer. Está completamente errada. As editoras são importantes, como é evidente, e são também parte interessada no nosso sucesso, mas não são elas que têm de procurar os leitores. Os autores é que devem procurar os seus leitores. Eu, enquanto autor é que devo perceber onde é que estão os meus leitores e ir buscá-los.
Começaste com editoras mais pequenas, as chamadas “vanities”. Qual é a tua opinião sobre o papel que essas editoras, como a Chiado, por exemplo, desempenham no mercado literário em Portugal? Achas que servem exatamente para quê? Para ganharem dinheiro com o ego de pessoas que decidem ser escritoras “à força”, ou pelo contrário, vês aqui o lado positivo que se prende com a democratização das publicações?
Acho que são editoras como as outras, mas têm uma forma diferente de trabalhar. O autor que decide publicar numa vanity já sabe que terá de suportar a compra de uns quantos exemplares. Há boas e más, melhores e piores, como tudo, mas julgo que acabam por facilitar a vida a autores que até têm qualidade e que acabam por ser descobertos assim. Repara que, por exemplo, as edições de autor sempre existiram. Estas editoras são quase o mesmo, com a diferença que o autor não tem que se preocupar com a paginação, design, ou impressão do livro. Muitos autores de primeira linha começaram assim. Acho que o fundamental é, nós autores, não colocarmos a responsabilidade na editora. Nunca me queixei de nenhuma editora nem nunca me vou queixar porque a responsabilidade será sempre minha. Além disso, este sistema das várias editoras, umas que distribuem outras que não, umas que cobram, outras que não, tornam o sistema de publicação de um livro mais democrático. Só precisas de te preocupar em conquistar os leitores. Mais nada. Havendo leitores, o resto também vem. Vêm até as grandes editoras, porque cada vez mais, elas querem autores que já têm leitores. Agora há uma democracia pura. Não temos que nos preocupar sequer, como antes acontecia, em sermos escolhidos pelos jornalistas ou pela critica. Só precisamos de conquistar os nossos leitores.
Nunca fui à procura disso. Tenho mais de 500 mil livros vendidos. Portanto, tenho 500 mil pessoas que me podem criticar. São estas 500 mil pessoas que me podem criticar. Estou-me um bocado a borrifar para o resto. O que me interessa é chegar às pessoas que gostam do que eu escrevo. Hão de haver muitas que não gostam mas não é isso que me preocupa. Não há nenhum autor que seja apreciado por todos ou que seja reprovado por todos.
Alguma vez te sentiste de certa forma injustiçado pela forma como é tão fácil a um nome conhecido publicar um livro e vender milhares muito rapidamente, não por ser escritor mas por trabalhar na televisão, por exemplo?
Não. Não me incomoda nada. Não perco tempo com isso. Até acho que tudo isso é bom, é sinal de vitalidade, sinal de que as pessoas compram livros e para mim não há livros de primeira e livros de segunda. Não sou ninguém para dizer que este livro deve estar à venda e aquele não deve. Que este é um livro e aquele é lixo. O facto destes livros estarem no mercado e venderem muito é importante porque revitalizam o mercado. Aliás, uma editora que vende 20 mil exemplares de um autor pode depois ajudar a puxar outros autores menos conhecidos. Eu até diria que são estes autores que vendem muito que mais estão a ajudar os que vendem pouco, porque dessa forma os menos vendidos poderão ter mais apoio das editoras.
E os ghost-writers, o que pensas sobre isso?
Sei que há países onde é perfeitamente legal. Parece-me que até é normal que quando alguém muito conhecido tem uma história interessante para contar, mas não tem tempo ou talento para o fazer recorra a quem tem.
Mas enquanto leitor, não te sentes enganado quando compras um livro que pensas que foi escrito por “A” e afinal foi escrito por “B”?
Sim, claro. Penso que o que falta aqui é que seja tudo perfeitamente assumido. Compreendo as razões pelas quais isto acontece, mas penso que não seria assim tão desastroso assumir que a história de uma pessoa é contada por outra pessoa. Na capa de um livro deve estar sempre o nome de quem realmente escreveu.
Consideras-te um escritor ou um autor?
Consideras-te um escritor ou um autor?
Sou acima de tudo um gajo que escreve “umas cenas”. Acho que as pessoas vêm um escritor como uma figura iluminada e eu não gosto desse peso sobre mim. Não me levo assim tão a sério. Não a esse nível.
E que figuras iluminadas é que gostas de ler? Ou seja, que escritores tens como tuas principais referências?
Gosto de muitos. Na ficção, o Saramago é uma referência pela criatividade, O António Lobo Antunes, também. Na poesia ou prosa poética, Al Berto, Herberto Helder, Rui Nunes, Ruy Belo, estes nomes mexeram muito comigo e ainda mexem.
Achas que o Lobo Antunes já devia ter ganho um Nobel?
Sei lá...é muito difícil ser um português a ganhar esses prémios. Fiquei feliz o ano passado por ter sido o Bob Dylan, outro gajo que “escreve umas cenas”, a ganhar o Nobel, porque foi alguém de fora da área e isso foi sinal de que finalmente se percebeu que a escrita é muito abrangente e que para se ser escritor não têm que se escrever romances. Alguém que escreve poemas, letras que são depois musicadas também é um escritor. Mas claro que fiquei com pena por não ter sido o Lobo Antunes. Como português, ficava feliz.
E tu? Já alguma vez pensaste que poderás um dia receber um Nobel?
Não, nunca pensei nisso. (risos) Não me passa pela cabeça sequer. Se eu gostava? Claro que gostava, mas não escrevo a pensar nisso.
Um desejo mais realista e mais próximo também: É quase natal. Já pensaste sobre o que queres no teu sapatinho?
Amar e ser amado. Não apenas a nível pessoal mas também profissional. Amar e ser amado pelos meus leitores.
Texto: Ana Cristina Pinto
Fotografia: Ana Cristina Pinto/ Internet
Fotografia: Ana Cristina Pinto/ Internet
Artigo publicado no Jornal Região Oeste
www.facebook.com/JRO-Jornal-Região-Oeste
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