Foto de Perfil: Cláudia Picado - A Voz do Oeste
“Posso cantar tudo, mas é o fado que tenho dentro de mim.”
É natural do Cadaval, onde viveu toda a sua vida até ingressar no ensino superior. Na infância, já gostava de cantar e idolatrava Whitney Houston, que gostava de imitar, em especial quando afinava a voz para cantar “The Greatest Love Of All”. Aos treze anos participou no concurso da RTP “Os Principais” que venceu com um tema de Mariah Carey “Without You”, mas foi o fado que lhe saiu da garganta a ditar o seu sucesso. “A Grande Noite do Fado” em 1998 volta a dar-lhe a vitória na categoria de Juvenis e desde então nunca mais parou. Hoje, Cláudia que já é mãe, ensina o pequeno Nuno Salvador a cantar e tem no marido, o guitarrista José Duarte, na mãe e avó, os seus grandes apoios. Emociona-se quando fala do pai e acredita ter nele o seu grande protetor, apesar de já não o ter perto dela. Cláudia Picado, pode dizer-se, é a voz do Cadaval, e com muito orgulho, leva a vila onde nasceu aos quatro cantos do mundo.
No meio do seu percurso escolar, e do seu gosto pela música encaixou-se o fado. Como é que isso aconteceu?
No meio do seu percurso escolar, e do seu gosto pela música encaixou-se o fado. Como é que isso aconteceu?
Eu já tinha o hábito de cantar. Na escola fazíamos karaokes e eu participava sempre. Descobri o fado por causa do meu pai. Em 1997 participei no programa “Os Principais” da RTP, e venci. Depois desse programa, o meu pai perguntou-me: “E se começasses a cantar fado?”. Na altura não pensei nisso muito a sério. Uma das minhas referências da época era a Dulce Pontes que cantava alguns fados e eu comecei a ouvi-la ainda mais, nesse registo. “A Canção do Mar” na voz da Dulce era um tema de que eu gostava muito. A abordagem dela era diferente daquela que conhecíamos na voz da Amália e eu apaixonei-me pelo estilo. Um grande amigo do meu pai, o Eduardo Lemos, também foi um grande pilar nesse início da minha incursão pelo fado. Comecei a cantar com ele à viola.
Hoje sente que enveredar pelo fado e não por outro género musical, foi a escolha certa?
Sim, não me revejo a cantar noutros géneros. Posso cantar tudo mas é o fado que tenho dentro de mim. Acredito que não se ensina a cantar o fado. Costumo dizer que se canta muito fado mas nem sempre o fado acontece. Até porque o fado não se canta, o fado sente-se.
Começou o ano de 2017 em grande, com a atribuição do Prémio Duquesa do Cadaval, pela Câmara Municipal. Como é que foi receber esse reconhecimento?
Eu soube durante um espétaculo. Quando o meu marido me deu a notícia, fiquei uns quinze minutos seguidos a chorar. Depois encarei que era mesmo verdade. Este prémio teve um significado especial. Dediquei esta condecoração ao meu pai que faleceu quando eu tinha catorze anos e a morte do meu pai foi a pior coisa que me aconteceu até hoje. Ele foi a pessoa que sempre me impulsionou e acompanhou, foi um homem muito especial para mim, e julgo que também para o Cadaval. Ele era uma pessoa muito ativa. Foi vereador, esteve ligado ao desporto, à cultura, aos bombeiros, e era uma ótima pessoa. Faleceu com 38 anos. Por isso, eu sei o que é perder alguém que tem ainda a vida toda pela frente, que deixa uma filha com catorze anos que precisava tanto dele, e que precisa ainda, claro. Então essa homenagem que me fizeram eu tinha que a passar para ele. Essa condecoração foi para mim mas foi ainda mais para ele. O meu pai morreu quando eu me tinha inscrito na Grande Noite do Fado. Fiquei apurada para participar, mas depois, com a morte dele não queria ir. Fui por ele. Cresci sempre com esta ligação muito forte ao meu pai e essa ligação estende-se ao Cadaval.
Ele continua aqui e este vai ser sempre o meu refúgio. Quando me perguntam de onde sou eu, digo sempre que moro em Lisboa, mas que sou do Cadaval. Lembro-me que num programa de televisão com a Sónia Araújo, perguntaram-se se eu tinha orgulho na minha terra e eu comecei a chorar tal como estou agora. Não me abri como estou a fazer consigo, mas até esta ligação à minha terra, eu devo-a ao meu pai. Devo dizer que o meu pai chamava-se Nuno Picado e o meu filho chama-se Nuno Salvador Picado Duarte. Tem o Nuno de um avô e o Salvador de outro.
E o seu filho, gosta de a ouvir cantar?
Às vezes quando me ouve cantar diz que sou uma chata mas já canta comigo algumas músicas. Fiz um vídeo dele a cantar o refrão do “Amar pelos Dois” do Salvador Sobral. Gravei nas escadas do prédio para aproveitar a acústica do espaço e noto que ele já tem facilidade em cantar dentro do compasso e com muita harmonia. E tem uma voz bonita apesar de ainda ser uma voz de criança.
Isso quer dizer que gostaria que ele seguisse os seus passos?
Eu gostava que ele aprendesse a tocar um instrumento musical ligado ao fado. Guitarra Portuguesa, por exemplo. Mas acima de tudo, quero que ele siga os sonhos dele.
O seu marido costuma subir consigo ao palco?
Sim. Eu canto com vários músicos, não tenho nenhuma exclusividade com nenhum, mas o meu marido acompanha-me muitas vezes também no palco. O disco que vem agora aí tem a produção musical de outros guitarristas, o Guilherme Banza, por exemplo, e tem também a conceção, a ajuda e a força de um homem com H muito grande como há poucos, o Tozé Brito. Já saiu em 2017 o primeiro single com a produção destes músicos, agora vai sair o segundo single com o disco.
Já há data para a saída do disco?
Não, mas vai ser este ano.
Para além da vitória, que outras boas recordações ficaram da Grande Noite do fado?
Muitas. Nessa noite conheci algumas pessoas que se tornaram importantes para mim A Ana Moura foi mais um conhecimento que fiz nessa noite. Curiosamente, ela ficou em 3.º lugar na categoria de séniores. A carreira dela também começou aí. Foi curioso também que no dia seguinte o Correio da Manhã apresentou um artigo a falar de nós. Estávamos as duas juntas quando nos vieram entrevistar. Depois de continuar a cantar por vários sítios voltei ao Casino do Estoril para cantar um fado e foi nessa noite que o Carlos Zel me chamou e perguntou: “Menina, quando é que quer vir fazer um espetáculo connosco?” O Carlos Zel foi também uma das minhas grandes referências e que me ajudou imenso no início do meu percurso.
Este caminho tem levado a Cláudia além-fronteiras para levar o fado não apenas às comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo mas também para os próprios nativos desses países. Como é que o fado é recebido por quem não é português?
Eu adoro cantar fora de Portugal. Quando o faço para as comunidades portuguesas sinto-me recebida de uma forma muito intensa, como se eles estivessem a receber o próprio país. Durante aqueles cinco minutos em que eu estou a cantar um fado, eles estão a absorver uma parte de Portugal. A saudade que eles sentem do país é tanta que quando nos recebem já sabem que nós lhes levamos um bocadinho muito nosso. Cantar lá fora é dobrar as emoções. Os portugueses recebem-nos sempre de coração aberto. Quando canto para os nativos desses países também é muito emocionante. Eu estive no Japão várias vezes e numa delas o último espetáculo que lá fiz foi na maior sala de Tóquio que tem mais ou menos uma capacidade para seis mil pessoas. Essa sala estava completamente lotada só com japoneses. Foi uma noite indescritível. A receção era diferente mas igualmente especial porque eles, sem conhecerem o nosso país, a nossa cultura, e principalmente sem entenderem a nossa língua, reagiam ao fado como se percebessem cada palavra. Eles comoviam-se e choravam. A música tem esta capacidade. E isso é absolutamente incrível.
E próximos espetáculos? Quais são?
Vou estar no Açores no final do mês de 16 a 27 de janeiro, e ainda este ano está prevista uma viagem a Israel. O convite para lá cantar já foi feito, eu já aceitei, só faltam os detalhes e a marcação da data.
Melhor qualidade –Autenticidade
Pior defeito –Justiceira
Local de férias favorito –Amesterdão
Melhor refúgio –A minha casa no Cadaval
Felicidade é... -Amar e ser amada.
Texto: Ana Cristina Pinto
Fotografia: Margarida Silva
Foto de Perfil é uma rubrica do Jornal Região Oeste
Artigo publicado no Jornal Região Oeste
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