Rui Calisto " Ser escritor é uma aventura".

Foto de Rui Calisto.



Rui Calisto nasceu em 1965, no Brasil, mas reside atualmente em Lisboa, para onde se mudou em 2001. Viveu em Luanda de 16 de Março de 1974 a Maio de 1975. Atuou em 46 peças (até 2007), e foi encenador em 38 peças (até 2015). Foi ainda professor de Arte Dramática.  Actual biógrafo do poeta e médico José Martins Fontes; conselheiro da Cruz Vermelha Brasileira (filial municipal de Santos); presidente do Instituto Cultural e Humanístico José Martins Fontes (Brasil); sócio-fundador da Sociedade Brasileira de História da Medicina; sócio-titular da Ordem Nacional dos Escritores (Brasil); sócio-fundador da Almanzor - Companhia de Teatro Experimental de S. Miguel da Guarda (Portugal). Em 2015 lançou o livro" Espero Por Ti em Luanda".

Foto de Rui Calisto.

O Rui não é apenas escritor. Está ligado também a outras artes. Invadindo um bocadinho a sua esfera pessoal, quem é o Rui Calisto?

Sou, também, ator e encenador, tendo atuado em 46 peças e encenado 38, tanto no Brasil quanto em Portugal. 

Espero por ti em Luanda é um romance que revela muito das vivências dos portugueses em África na altura da descolonização. Foi difícil para si reviver dias tão difíceis? 

Naturalmente, em todas as passagens, e são muitas, em que a realidade se mostra, senti um certo abalo emocional. A experiência vivida naquele período, naquela cidade extraordinária, fizeram com que passasse a ver o mundo de um modo mais humano e a desejar que a própria Humanidade perceba que aquilo que produz, para o Bem ou para o Mal, é o que fica na História e no coração das pessoas. É muito bom quando, através de um livro, conseguimos despertar os nossos semelhantes, alertando-os para uma reavaliação de todas as suas atitudes e pensamentos. 

Ver um mundo hostil pelos olhos de uma criança, torna tudo mais fácil? 
Não. Quando, em criança, somos “presenteados” com violência, logo aí desconfiamos que nada justifica uma guerra. Mais tarde descortinamos os reais interesses que estão por trás dessa monstruosidade e ficamos com a certeza de que nada daquilo faz qualquer sentido. Depois de uma autoanálise percebemos que foi trágico para quem pereceu na contenda, mas, por incrível que possa parecer, de um valor inestimável para quem sobreviveu, despertando para a realidade do desenvolvimento físico e mental de modo mais acelerado e lúcido. 

 Quais são as melhores recordações que tem de Angola?
Os aromas, a delicadeza do povo angolano, a sua beleza física, a sua alimentação à base de cereais, frutas e legumes tipicamente locais (que é a base da minha alimentação atual), tudo muito “puxado à terra”.
O seu livro mostra-nos que há sempre lugar para o amor, mesmo em tempos difíceis. É essa a mensagem principal da sua história?
A mensagem principal da história poderia ficar-se pelo “Amem-se uns aos outros”, porém, creio que passa também por: “Respeitem-se uns aos outros”. Amor e Respeito devem, a meu ver, ser a mola propulsora dos tempos que surgem. Para apagarmos da mente todas as rudezas que nos castraram a alma nos últimos cem anos.

Foto de Rui Calisto.

Como é ser escritor em Portugal? E o que acha que é urgente mudar?
Ser escritor em Portugal é uma aventura. O povo português lê pouco e o que lê é instigado pela mídia, e esta, na maioria das vezes, divulga maciçamente os amigos e/ou os próprios colaboradores, estes, por sua vez, sabendo da grande abertura que possuem, lançam, todos os anos, o seu “sensacional “ título novo, que, se for bem analisado, não passa de pastiche do que lançaram nos anos anteriores. O povo, pouco esclarecido, vai de encontro à propaganda. O autor que for possuidor de mais abertura na mídia é o que mais vende. Não é justo para os excelentes escritores que existem em Portugal e que não possuem essa benesse. É urgente mudar o modo de encarar a edição de um livro. Tem que ser por mérito e não porque o autor pagou para ser editado (como acontece em algumas editoras que vivem da vaidade dos autores). É urgente, também, formar leitores, através da Educação e da Cultura, ou seja, passar a informação pelas Escolas, que é o lugar onde tudo fará sentido. É urgente sensibilizar a mídia, obrigando-a a diminuir a programação estúpida e violenta que apresentam diariamente, trocando-a por Cultura e Educação, ou seja Informação de alto nível, para construir mentalidades. Neste caso, os políticos (que são os que investem na desculturalização do povo) podem ter a certeza de que uma população culta, esclarecida, pode continuar a votar neles, se eles, logicamente, pensarem no Bem comum e não apenas no próprio umbigo.
Se este livro desse um filme, que ator e atriz gostaria de ver nos papeis principais?

Para o papel do menino Rui, gostaria de ver o João Gabriel D’Aleluia, pois, creio que é atualmente o melhor ator do Brasil. O realizador é que poderia não estar interessado, por ser um ator negro sendo a personagem branca. A outra opção, também boa, recai no Kadu Schons, outro grande valor a despontar. O papel da Ngeve ficaria perfeito na pele da talentosíssima Lucy Ramos. A dramaturgia brasileira é riquíssima e a escolha, peço desculpa aos incomodados, recairia nos atores brasileiros. 

Está a terminar mais um romance que estará ao alcance das estantes dos portugueses em breve. Pode falar-nos um bocadinho dele?

Posso dizer que a acção decorre no ano de 1935, numa Lisboa de encanto e beleza. A personagem principal é masculina, adulta, repleta de incertezas e de perturbações do Eu. Uma viagem do autor por um mundo cheio de inseguranças. Não é um romance autobiográfico, inclusive, existe uma distância absoluta entre o autor e essa personagem, porém, é um texto que respeita a história vivida naquele período, com todas as nuances que a preencheram.



Sinopse:
Aos nove anos de idade, Rui vive um drama intenso. Corria o ano de 1974, e a radiosa e próspera Luanda transforma-se num inferno. Milhares de portugueses são ameaçados pelas guerrilhas, sentindo as suas cabeças a prémio. Muitos são assassinados. O menino é obrigado a crescer. No meio deste terrível cenário, surge uma elegante e terna morena de olhar intenso, que o vai fazer perder-se de amores.
Poderá um coração apaixonado manter-se vivo entre as tormentas da guerra?

À venda em todas as livrarias.




Texto: Ana Cristina Pinto
Fotografia: Rui Calisto

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